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25 de março: Dia Nacional do Oficial de Justiça

Hoje é dia de homenagearmos os Oficiais de Justiça de todo o país, em especial (aqui para nós), aqueles e aquelas que integram o Poder Judiciário do Estado de Alagoas. E nada melhor do que fazer isso mostrando a importância do trabalho desses profissionais na consolidação da justiça e na pacificação de conflitos sociais.

Vamos começar destacando o papel do Oficial de Justiça. É ele que faz chegar à sociedade a notificação das decisões judiciais a pessoas de todas as condições socioeconômicas, às vezes enfrentando situações emocionantes e até engraçadas; às vezes arriscadas… levando comunicados nem sempre bem-vindos ao cidadão ou cidadã que os recebe.

Citações, intimações, notificações, remoções de bens, fiscalizações, desocupações, reintegração de posse fazem parte da sua rotina, constituída quase que totalmente em expediente externo, faça sol ou faça chuva, e cumprida diariamente, mesmo em tempos difíceis como o que temos vivido durante a pandemia da Covid-19.

Sim, durante a pandemia, embora a maioria das atividades do Judiciário tenha se adequado ao trabalho remoto, boa parte dos oficiais de justiça continuou tendo que ir à rua ou ao campo, cumprir sua missão de levar até o cidadão as decisões judiciais, transformando sentenças em histórias reais. Não é à toa que o Oficial de Justiça é considerado “o braço estendido do juiz”. Porque é ele o elo que liga a Justiça e o cidadão.

E para ilustrar nossa homenagem no dia dedicado a esses servidores públicos conversamos com o Oficial de Justiça Isac Machado dos Santos Junior, 17 anos de carreira, exercendo suas atividades na comarca de Delmiro Gouveia, no alto sertão alagoano.

Como o Oficial de Justiça exerce suas funções?

  • Mais de 90% é trabalho externo, cumprindo diligências, levando notificações - boas ou ruins - cumprindo mandados. Mas há alguns momentos em que trabalhamos internamente, porque todo comunicado tem que ser certificado - essa é a nossa segurança - e essa certidão, somos nós que fazemos. 

Quais as principais dificuldades enfrentadas no dia a dia?

  • Para quem trabalha no interior do Estado uma das grandes dificuldades tem sido o acesso aos recursos de tecnologia que facilitariam nosso trabalho. Durante a pandemia, boa parte dos oficiais de justiça passou a realizar seu trabalho de forma remota, mas, por causa dessa dificuldade tecnológica, outra grande parte, principalmente quem trabalha no interior, como eu, atravessou a pandemia trabalhando presencialmente, porque, ou é isso, ou não conseguimos cumprir nosso trabalho. 

  • Somos como os trabalhadores dos Correios, que entregam encomendas; levamos documentos importantes que precisam ser entregues. E se não temos como entregar virtualmente, por dificuldade nossa ou da pessoa que vai receber, temos que levar pessoalmente.

  • Os problemas de localização, por causa de endereços incompletos ou inexistentes, também fazem parte dos desafios do nosso cotidiano, além das situações de risco que enfrentamos.

Considera uma função perigosa?

  • Sim, tem seus riscos. Nossa função, muitas vezes leva uma notícia boa, de uma causa ganha, de uma herança recebida; mas também leva notícias de difícil assimilação, que o cidadão não gostaria de receber, e aí somos alvo de animosidade, desaforos, ameaças, às vezes até violência física. Isso requer de nós equilíbrio emocional, muita calma e capacidade de dialogar.

Já sofreu algum tipo de ameaça?

  • Sim. A maioria das pessoas não gosta de ter, em sua porta, um Oficial de Justiça. Já enfrentei situações de grosseria, ameaças, e temos que nos desdobrar, usar toda a psicologia para acalmar os ânimos, explicar o nosso trabalho, tentar orientar essas pessoas.

  • Esta semana enfrentei uma situação dessas; senti-me ameaçado. Fui levar a intimação de um senhor acusado na Lei Maria da Penha e a recepção não foi nada boa. Mas consegui contornar com muita calma; explicar que aquela intimação representava para ele o momento de apresentar sua defesa. Acabou assinando.

Já sofreu agressão física?

  • Não, mas conheço muitos oficiais que já sofreram violência física. Não é raro termos casos assim no desempenho de nossas atividades. Levamos decisões judiciais; andamos em locais que vivem sob domínio do crime; do tráfico de drogas; temos contato com criminosos…

Vocês têm algum tipo de proteção no exercício de suas funções?

  • Geralmente nossa missão é solitária, mas em alguns casos, como ordens de despejo, reintegração de posse, é necessário o acompanhamento da polícia. Mas no dia a dia, andamos desacompanhados. O Oficial de Justiça não tem direito a porte de arma. Deveria ter - não para responder na bala a qualquer insulto, mas para as pessoas, nos lugares onde andamos para exercer nossas atividades, saibam que não estamos tão desprotegidos. 

  • Também deveríamos ter cursos de defesa pessoal; de abordagem - os policiais são preparados em estratégias para saber se aquela pessoa com quem estão lidando está armada ou não. Precisamos um pouco disso, para evitar surpresas que nos custem a vida. Também precisaríamos de suporte psicológico para lidar com situações com as quais nos deparamos; para manter o equilíbrio emocional e saber contornar.

Tem alguma situação que lhe marcou nesses 17 anos de carreira?

  • Muitas! Algumas divertidas; outras dramáticas; outras que nos causam emoção.

Vamos à divertida:

  • Fui entregar uma intimação mas não encontrei a demandada no endereço citado. A casa estava de porta fechada e com placa de aluguel. Logo apareceu a vizinha informando que ela estava se escondendo, porque devia a muita gente, e se prontificou a ajudar com o novo endereço. Deixei o veículo na outra esquina, agradeci, me despedi e fui ao local indicado. Consegui fazer a intimação, mas quando voltei, levei o maior susto. Saindo de um beco, eis que surge, de repente, à minha frente, a vizinha informante. Curiosa, ela tinha ficado escondida no local para saber o resultado da intimação.

 E a dramática…

  • Um mandado de busca e apreensão, envolvendo uma criança que o pai tinha conseguido a guarda e a mãe se negava a entregar. Eles discutiam, a criança chorava, sem querer ir, dizia que na casa do pai era maltratada pela avó - e o Oficial de Justiça no meio, com a missão de fazer cumprir a sentença judicial; de apaziguaros ânimos. 

  • Foi um processo prolongado, desgastante; começou às 8h e se estendeu até as 16h30 (no nosso trabalho, tem dessas coisas: muitas vezes passamos da hora de almoçar, de voltar para casa), mas no fim, convencemos a criança a seguir com o pai; orientamos a ligar para o Disque 100, em qualquer situação de maus tratos; prometemos que haveria acompanhamento; e nos prontificamos a seguir com ela, no táxi com o pai, até a rodoviária. 

  • No caminho, longe da pressão da briga entre os pais, ela olhou pra mim e disse, tranquilamente: “Tio, precisa não ligar pro Disque 100, porque lá eu sou muito bem tratada”. Provavelmente havia sido instruída pela mãe a falar em maus tratos, para embaraçar o cumprimento da sentença de guarda paterna.

Uma situação que te emocionou:

  • Semana passada, fui portador de uma decisão da Justiça que obrigava o Estado a bancar os custos de uma cirurgia cardíaca muito esperada pela família, para salvar a vida de um rapaz que estava com problemas graves. A notícia foi recebida com muita emoção, as pessoas choravam de alegria, e a gente também se deixa tocar com esse clima de emoção. Senti-me muito feliz por estar ali, e ser o portador daquela notícia.

Você gosta do que faz? 

  • Adoro a minha profissão; gosto do contato com as pessoas, principalmente quando levamos boas notícias, como esta da cirurgia. Vivemos assim, o nosso dia a dia, num misto de alegrias e tristezas que presenciamos. Nesse período de pandemia, me propus a não parar com o trabalho presencial, porque gosto; por causa das dificuldades enfrentadas para o trabalho remoto e por entender a importância do nosso trabalho na consolidação da justiça. Somos essenciais, SIM, e trabalhamos com a promoção da paz e da justiça. É preciso que as pessoas, quando disserem: “Lá vem o Oficial de Justiça”, entendam que estamos levando a Justiça onde ela deve chegar; que apenas estamos cumprindo decisões judiciais em situações em que não houve conciliação. Esse é nosso trabalho, e tenho muito orgulho dele.